Corrida para a Prefeitura de Curitiba

Opinião

Valorização da convivência complementar

Explorando a convivência familiar e a importância do diálogo entre gerações para superar conflitos e promover aprendizado mútuo.Explorando a convivência familiar e a importância do diálogo entre gerações para superar conflitos e promover aprendizado mútuo.
Vinícius Sgarbe
/
Adobe Firefly
Maku de Almeida

<span class="abre-texto">Há tempos atrás, nem me atrevo a contar</span> este tempo em anos, um homem sábio me falou algo que marcou na minha memória um registro indelével. Ele me disse: filhos são portas para o aprendizado, para o novo, para o que ainda não conhecemos.

A nós, pais, o desafio de manter a porta aberta. Quando ouvi, minha filha mais velha era uma bebezinha. Eu ainda não havia experimentado grandes desafios, exceto um amor visceral, novo, abrangente e muito preocupado. Ecoava em minha mente estas duas orientações: observe e mantenha a ponte de contato.

Dentro do hábito humano de colocar em caixinhas e rótulos comportamentos, há muitas obras conceituando gerações, dando-lhes nomes e características gerais.

Junto com as rotulações cresceu o clamor para identificar, diagnosticar, temer o conflito intergeracional. Geração após geração, em algum momento, por razões de sobrevivência e individuação, conflitos aparecem. Com nome ou não, por um tempo, pautam o relacionamento do ser em desenvolvimento com seus pais ou mentores. E é necessário ao desenvolvimento de um e ao desapego do outro. É fundamental para que a vida do filho não seja reduzida aos desejos egóicos dos pais.

É ameaçador para os cuidadores este mundo com todas as coisas novas que eles ainda não dominam.

É ameaçador para os jovens, a certeza, a segurança, o lugar claustrofóbico onde os “óbvios” se alojam. É ameaçador para os cuidadores que os mais jovens queiram resolver suas vidas com métodos e meios nunca antes vistos; é ameaçador para os cuidadores que seu processo analógico de tomada de decisão seja dominado pelo mundo digital. É ameaçador para os jovens estar constantemente sob julgamento e tentativas de conformação. Uma lista interminável de medos, dos dois lados, poderia consumir páginas e páginas de considerações.

De certa maneira, a coreografia de enfrentamento se repete a cada geração, em cenários diferentes, com avanços e retrocessos culturais, morais, sociais. Retirando as peles do fenômeno, uma a uma, encontramos no cerne, no miolo, um descolamento, um distanciamento entre pessoas que, partilhando da mesma comunidade familiar, deixaram de se olhar e se escutar.

O grande desafio de manter a porta aberta. Enquanto filhos, muito do mundo novo que desvelamos, poderíamos apresentar para nossos cuidadores... O maravilhamento das descobertas, o lento progredir da construção e experimento das nossas asas rumo à autonomia.

Enquanto cuidadores, muito poderíamos aproveitar destas lufadas de ar renovado para atualizar nossas convicções, espanar a poeira dos nossos óbvios, atualizar nossos “aplicativos” operacionais internos.

Um diálogo rico em possibilidades poderia unir o pensamento analógico com os assombrosos processos digitais – e com a consistência de um e a agilidade do outro, alcançar objetivos e metas, criar, resolver, produzir soluções para um bom viver. Penso que, ao invés de seguir com o olhar nas diferenças, é mais do que hora de focar no aprender com.

Não há tutorial no planeta que possa ensinar a textura correta do pão de queijo que aprendi com minha mãe, que aprendeu com sua avó – além do passo a passo feito com as cabeças quase coladas. Contudo, fotografar este pão de queijo, transformá-lo em um maravilhoso frame, com ajuda da IA recriar a cozinha da bisavó – já não me sinto capaz (ainda, pois pretendo aprender e já vislumbro onde irei pedir aulas). Manter as portas abertas significa principalmente não julgar e validar em conjunto as possibilidades.

Manter as portas abertas é, de fato, de verdade, se interessar pelo mundo visto através dos olhos dos jovens e respeitar a experiência deles.

Há oportunidades para ambos os lados desta conversa. Muito aprendi com meus quatro filhos e sigo aprendendo. Vez por outra, os assisto – faz tempo estou fora dos palcos das suas existências – e fico emocionada com o jeito de cada um resolver a própria vida.

Todos me ultrapassaram – são seres humanos enfrentando os seus desafios, cada um a seu modo, abertos para o aprendizado e para os diálogos. Manter as portas abertas é um trabalho de equipe. Decisão a ser tomada pelos dois lados – contudo, liderado pelo mais experiente, iniciado por quem pode modelar respeito pragmaticamente. Manter as portas abertas é ato sustentado pelo diálogo respeitoso, pela suspensão deliberada de julgamento, o amor substituindo a obrigação, a espontaneidade no lugar dos rituais automáticos.

Ahh, os jovens de hoje! Todos nós um dia estivemos exatamente neste lugar: em relação a nós, algum adulto assustado reclamou da juventude de hoje!

Última atualização
17/3/2024 14:03
Maku de Almeida
Analista transacional. Escreve aos domingos.

Compreender o passado ajuda a construir um presente consciente

Compreender o passado ajuda a construir um presente consciente

Maku de Almeida
19/5/2024 16:26

Uma sequência de decisões me trouxe até aqui. Nem todas foram boas ou sensatas. Algumas foram realmente muito ruins. Gosto muito deste "aqui" e fico tentada a pensar: eu chegaria até aqui por outro caminho? Há coisas que ainda quero iluminar. Não me falta coragem. Mas há grandes e sensacionais conquistas. Portanto, gratidão ao aqui. Pois o lá já virou pó.

A respeito disso, um filósofo espanhol que eu aprecio sem moderação, José Ortega y Gasset, em seu livro Meditaciones del Quijote, diz: “eu sou eu e minha circunstância e se não salvo a ela, não salvo a mim".

Preparar panquecas e viver é uma receita de amor e paciência

Preparar panquecas e viver é uma receita de amor e paciência

Jane Hir
19/5/2024 16:08

Algumas comidas são marcadas pelo afeto. Tenho memória afetiva de muitas e entre elas está a panqueca. Na minha infância, que já transcorreu há muito tempo, a mágica das rodelas de massa dourada sendo viradas em um gesto preciso era realizada pela minha avó.

Em uma época de poucas variedades alimentícias, pelo menos para uma família numerosa como a nossa e mantida por um pai operário, a panqueca recheada de doce de leite feito em casa ou apenas polvilhada com açúcar e canela, assumia ares de requinte.

Opinião

Valorização da convivência complementar

Explorando a convivência familiar e a importância do diálogo entre gerações para superar conflitos e promover aprendizado mútuo.Explorando a convivência familiar e a importância do diálogo entre gerações para superar conflitos e promover aprendizado mútuo.
Vinícius Sgarbe
/
Adobe Firefly
Maku de Almeida
Analista transacional. Escreve aos domingos.
17/3/2024 13:57
Maku de Almeida

Pais e filhos aprendem juntos na convivência intergeracional

<span class="abre-texto">Há tempos atrás, nem me atrevo a contar</span> este tempo em anos, um homem sábio me falou algo que marcou na minha memória um registro indelével. Ele me disse: filhos são portas para o aprendizado, para o novo, para o que ainda não conhecemos.

A nós, pais, o desafio de manter a porta aberta. Quando ouvi, minha filha mais velha era uma bebezinha. Eu ainda não havia experimentado grandes desafios, exceto um amor visceral, novo, abrangente e muito preocupado. Ecoava em minha mente estas duas orientações: observe e mantenha a ponte de contato.

Dentro do hábito humano de colocar em caixinhas e rótulos comportamentos, há muitas obras conceituando gerações, dando-lhes nomes e características gerais.

Junto com as rotulações cresceu o clamor para identificar, diagnosticar, temer o conflito intergeracional. Geração após geração, em algum momento, por razões de sobrevivência e individuação, conflitos aparecem. Com nome ou não, por um tempo, pautam o relacionamento do ser em desenvolvimento com seus pais ou mentores. E é necessário ao desenvolvimento de um e ao desapego do outro. É fundamental para que a vida do filho não seja reduzida aos desejos egóicos dos pais.

É ameaçador para os cuidadores este mundo com todas as coisas novas que eles ainda não dominam.

É ameaçador para os jovens, a certeza, a segurança, o lugar claustrofóbico onde os “óbvios” se alojam. É ameaçador para os cuidadores que os mais jovens queiram resolver suas vidas com métodos e meios nunca antes vistos; é ameaçador para os cuidadores que seu processo analógico de tomada de decisão seja dominado pelo mundo digital. É ameaçador para os jovens estar constantemente sob julgamento e tentativas de conformação. Uma lista interminável de medos, dos dois lados, poderia consumir páginas e páginas de considerações.

De certa maneira, a coreografia de enfrentamento se repete a cada geração, em cenários diferentes, com avanços e retrocessos culturais, morais, sociais. Retirando as peles do fenômeno, uma a uma, encontramos no cerne, no miolo, um descolamento, um distanciamento entre pessoas que, partilhando da mesma comunidade familiar, deixaram de se olhar e se escutar.

O grande desafio de manter a porta aberta. Enquanto filhos, muito do mundo novo que desvelamos, poderíamos apresentar para nossos cuidadores... O maravilhamento das descobertas, o lento progredir da construção e experimento das nossas asas rumo à autonomia.

Enquanto cuidadores, muito poderíamos aproveitar destas lufadas de ar renovado para atualizar nossas convicções, espanar a poeira dos nossos óbvios, atualizar nossos “aplicativos” operacionais internos.

Um diálogo rico em possibilidades poderia unir o pensamento analógico com os assombrosos processos digitais – e com a consistência de um e a agilidade do outro, alcançar objetivos e metas, criar, resolver, produzir soluções para um bom viver. Penso que, ao invés de seguir com o olhar nas diferenças, é mais do que hora de focar no aprender com.

Não há tutorial no planeta que possa ensinar a textura correta do pão de queijo que aprendi com minha mãe, que aprendeu com sua avó – além do passo a passo feito com as cabeças quase coladas. Contudo, fotografar este pão de queijo, transformá-lo em um maravilhoso frame, com ajuda da IA recriar a cozinha da bisavó – já não me sinto capaz (ainda, pois pretendo aprender e já vislumbro onde irei pedir aulas). Manter as portas abertas significa principalmente não julgar e validar em conjunto as possibilidades.

Manter as portas abertas é, de fato, de verdade, se interessar pelo mundo visto através dos olhos dos jovens e respeitar a experiência deles.

Há oportunidades para ambos os lados desta conversa. Muito aprendi com meus quatro filhos e sigo aprendendo. Vez por outra, os assisto – faz tempo estou fora dos palcos das suas existências – e fico emocionada com o jeito de cada um resolver a própria vida.

Todos me ultrapassaram – são seres humanos enfrentando os seus desafios, cada um a seu modo, abertos para o aprendizado e para os diálogos. Manter as portas abertas é um trabalho de equipe. Decisão a ser tomada pelos dois lados – contudo, liderado pelo mais experiente, iniciado por quem pode modelar respeito pragmaticamente. Manter as portas abertas é ato sustentado pelo diálogo respeitoso, pela suspensão deliberada de julgamento, o amor substituindo a obrigação, a espontaneidade no lugar dos rituais automáticos.

Ahh, os jovens de hoje! Todos nós um dia estivemos exatamente neste lugar: em relação a nós, algum adulto assustado reclamou da juventude de hoje!

Maku de Almeida
Analista transacional. Escreve aos domingos.
Última atualização
17/3/2024 14:03

Compreender o passado ajuda a construir um presente consciente

Eu e minhas circunstâncias à busca de propósito

Maku de Almeida
19/5/2024 16:26

Uma sequência de decisões me trouxe até aqui. Nem todas foram boas ou sensatas. Algumas foram realmente muito ruins. Gosto muito deste "aqui" e fico tentada a pensar: eu chegaria até aqui por outro caminho? Há coisas que ainda quero iluminar. Não me falta coragem. Mas há grandes e sensacionais conquistas. Portanto, gratidão ao aqui. Pois o lá já virou pó.

A respeito disso, um filósofo espanhol que eu aprecio sem moderação, José Ortega y Gasset, em seu livro Meditaciones del Quijote, diz: “eu sou eu e minha circunstância e se não salvo a ela, não salvo a mim".

Preparar panquecas e viver é uma receita de amor e paciência

Jane Hir
19/5/2024 16:08

Algumas comidas são marcadas pelo afeto. Tenho memória afetiva de muitas e entre elas está a panqueca. Na minha infância, que já transcorreu há muito tempo, a mágica das rodelas de massa dourada sendo viradas em um gesto preciso era realizada pela minha avó.

Em uma época de poucas variedades alimentícias, pelo menos para uma família numerosa como a nossa e mantida por um pai operário, a panqueca recheada de doce de leite feito em casa ou apenas polvilhada com açúcar e canela, assumia ares de requinte.

Cidade Capital é um projeto de jornalismo.

47.078.846/0001-08

secretaria@cidade.capital