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Opinião

Um paralelo entre arte e boxe

O bronze helenístico do Boxeador descansando é o retrato realista de um atleta que espera, sentado numa pedra, pela próxima luta.O bronze helenístico do Boxeador descansando é o retrato realista de um atleta que espera, sentado numa pedra, pela próxima luta.
Reprodução
/
Luciana Paes

O bronze helenístico do Boxeador descansando, do Palazzo Massimo alle Terme, é o retrato realista de um atleta que espera, sentado numa pedra, pela próxima luta (na Antiguidade, um mesmo lutador enfrentava, na medida em que vencia, oponentes sequenciais).

A orelha de couve-flor com incisões (drenos) para controlar o inchaço, o nariz quebrado, as incrustações em bronze no braço que representam o sangue e o suor escorrendo, o antigo modelo grego de luva (a única coisa que ele veste), a infibulação do pênis (que tinha uma função protetora e de decoro), o tratamento dado aos músculos e à expressão facial, tudo isso faz do homem um homem, embora associações com Herakles descansando entre um e outro trabalho devam ter sido, no tempo da obra, inevitáveis.

O boxe aparece já nos jogos funerários em honra de Pátroclo, no livro XXIII da Ilíada, e foi introduzido nos Jogos Olímpicos em 688 a. C. Era tão valorizado pela nobreza grega, como uma forma de treinamento militar, que a orelha de couve-flor tornou-se uma marca de honra. Os golpes eram dados preferencialmente na face e na cabeça, diferente do pankration, que era uma combinação de boxe, luta-livre e kickboxe muito popular, cuja única interdição era colocar o dedo no olho, nariz ou boca do adversário (chutes na genitália, por exemplo, eram permitidos).

Um nome que vem imediatamente à ideia, quando se fala em arte e boxe, é o do pintor americano George Bellows (1882–1925). Na mesma época em que Bellows pintava, Jack London escrevia sobre boxe no San Francisco Examiner (há também ficção, traduzida, inclusive, para o português, como Nocaute – cinco histórias de boxe; o romance O jogo está, em inglês, em domínio público) e o presidente Roosevelt o praticava como amador. Em Stag at Sharkey's, 1909, um Bellows do Cleveland Museum, a agressividade do tema se beneficia da agressividade da pincelada e uma dança pesada e simbiótica (meio pré-baconiana) entre dois homens seminus e outro vestido (o juiz) tem lugar à luz do ringue. 

O epicentro do pugilismo migrou da Inglaterra para os Estados Unidos no fim do século XIX e, desde então, um vasto mercado – manuais, contos, romances, peças de teatro, filmes – em torno do tema foi se desenvolvendo. No cinema, por exemplo, ele chegou a virar uma espécie de subgênero dramático, encabeçado por clássicos como Rocky (1976) e Touro Indomável (1980) e cuja tônica é a do homem comum lutando, literalmente, contra os próprios demônios. Além disso, ninguém esquece as cenas de Buster Keaton aprendendo a “doce arte”, em Battling Butler (1926), ou de Charles Chaplin no ringue, em Luzes da cidade (1931). David Bowie, durante uma temporada nos Estados Unidos, também abraçou o esporte, tomando aulas com Richard Lord em Austin, Texas. Sintomaticamente, ele criou na época um grande hit: Let’s dance. Joseph Beuys participou, em 1972, de uma luta de boxe “pela democracia direta” que teve lugar no Museu Fridericianum, em Kassel, durante a Documenta 5. E um dos grandes artistas que o Brasil já produziu, Arthur Bispo do Rosário, era também pugilista. Interessante que os últimos três pratiquem e não somente tomem o esporte como tema, embora as ações se confundam no processo de criação.

O boxe, como o tênis e o futebol ou quaisquer esportes em que duas partes disputam, é a guerra sublimada. Provavelmente, a grande atração que exercem venha daí – consistem em espaços onde a agressividade pode ser colocada de modo controlado, limpo. Mas no boxe, em particular, a relação é mais pungente (ou um pouco menos sublimada), pois há, ali, um corpo a corpo que pode gerar derramamento de sangue, sérias lesões corporais e até mesmo, como já ocorreu, morte; a questão é que há sempre um indivíduo que prevalece e, como espectadores, queremos saber qual será. Sendo um substituto da experiência da guerra, o boxe como objeto da arte é uma espécie de sublimação da sublimação – a civilização em sua economia ordinária de automanutenção potencializada.

Última atualização
29/8/2023 18:00
Luciana Paes
Professora da Escola de Música e Belas Arte do Paraná/Universidade Estadual do Paraná.

Brasil bate recorde na geração de energia eólica em novembro de 2024

Brasil bate recorde na geração de energia eólica em novembro de 2024

Redação Cidade Capital
10/12/2024 10:21

O Brasil atingiu dois recordes consecutivos na geração de energia eólica em novembro deste ano. No dia 3, a produção média horária alcançou 23.699 megawatts médios (MWmed). Já no dia 4, foi registrado o maior volume diário, com 18.976 MWmed. Os dados foram divulgados nesta segunda-feira (9) pelo Ministério de Minas e Energia (MME).

Conforme a pasta, "os resultados destacam o avanço da energia eólica como uma fonte essencial para a matriz energética do país", confirmando o papel dessa tecnologia no fornecimento sustentável de energia.

Filme ‘Ainda estou aqui’ recebe indicação ao Globo de Ouro

Filme ‘Ainda estou aqui’ recebe indicação ao Globo de Ouro

Redação Cidade Capital
10/12/2024 10:02

O filme Ainda Estou Aqui, dirigido por Walter Salles, foi indicado ao prêmio Globo de Ouro na categoria de melhor filme de língua estrangeira. A atriz Fernanda Torres também foi indicada a melhor atriz junto com Tilda Swinton, Kate Winslet, Angelina Jolie e Nicole Kidman

Ainda Estou Aqui narra a trajetória da família Paiva — a mãe, Eunice, e os cinco filhos — após o desaparecimento do deputado Rubens Paiva, preso, torturado e morto pela ditadura militar brasileira. 

Opinião

Um paralelo entre arte e boxe

O bronze helenístico do Boxeador descansando é o retrato realista de um atleta que espera, sentado numa pedra, pela próxima luta.O bronze helenístico do Boxeador descansando é o retrato realista de um atleta que espera, sentado numa pedra, pela próxima luta.
Reprodução
/
Luciana Paes
Professora da Escola de Música e Belas Arte do Paraná/Universidade Estadual do Paraná.
28/8/2023 16:02
Luciana Paes

Artigo de professora Luciana Paes faz paralelo entre arte e prática do boxe

O bronze helenístico do Boxeador descansando, do Palazzo Massimo alle Terme, é o retrato realista de um atleta que espera, sentado numa pedra, pela próxima luta (na Antiguidade, um mesmo lutador enfrentava, na medida em que vencia, oponentes sequenciais).

A orelha de couve-flor com incisões (drenos) para controlar o inchaço, o nariz quebrado, as incrustações em bronze no braço que representam o sangue e o suor escorrendo, o antigo modelo grego de luva (a única coisa que ele veste), a infibulação do pênis (que tinha uma função protetora e de decoro), o tratamento dado aos músculos e à expressão facial, tudo isso faz do homem um homem, embora associações com Herakles descansando entre um e outro trabalho devam ter sido, no tempo da obra, inevitáveis.

O boxe aparece já nos jogos funerários em honra de Pátroclo, no livro XXIII da Ilíada, e foi introduzido nos Jogos Olímpicos em 688 a. C. Era tão valorizado pela nobreza grega, como uma forma de treinamento militar, que a orelha de couve-flor tornou-se uma marca de honra. Os golpes eram dados preferencialmente na face e na cabeça, diferente do pankration, que era uma combinação de boxe, luta-livre e kickboxe muito popular, cuja única interdição era colocar o dedo no olho, nariz ou boca do adversário (chutes na genitália, por exemplo, eram permitidos).

Um nome que vem imediatamente à ideia, quando se fala em arte e boxe, é o do pintor americano George Bellows (1882–1925). Na mesma época em que Bellows pintava, Jack London escrevia sobre boxe no San Francisco Examiner (há também ficção, traduzida, inclusive, para o português, como Nocaute – cinco histórias de boxe; o romance O jogo está, em inglês, em domínio público) e o presidente Roosevelt o praticava como amador. Em Stag at Sharkey's, 1909, um Bellows do Cleveland Museum, a agressividade do tema se beneficia da agressividade da pincelada e uma dança pesada e simbiótica (meio pré-baconiana) entre dois homens seminus e outro vestido (o juiz) tem lugar à luz do ringue. 

O epicentro do pugilismo migrou da Inglaterra para os Estados Unidos no fim do século XIX e, desde então, um vasto mercado – manuais, contos, romances, peças de teatro, filmes – em torno do tema foi se desenvolvendo. No cinema, por exemplo, ele chegou a virar uma espécie de subgênero dramático, encabeçado por clássicos como Rocky (1976) e Touro Indomável (1980) e cuja tônica é a do homem comum lutando, literalmente, contra os próprios demônios. Além disso, ninguém esquece as cenas de Buster Keaton aprendendo a “doce arte”, em Battling Butler (1926), ou de Charles Chaplin no ringue, em Luzes da cidade (1931). David Bowie, durante uma temporada nos Estados Unidos, também abraçou o esporte, tomando aulas com Richard Lord em Austin, Texas. Sintomaticamente, ele criou na época um grande hit: Let’s dance. Joseph Beuys participou, em 1972, de uma luta de boxe “pela democracia direta” que teve lugar no Museu Fridericianum, em Kassel, durante a Documenta 5. E um dos grandes artistas que o Brasil já produziu, Arthur Bispo do Rosário, era também pugilista. Interessante que os últimos três pratiquem e não somente tomem o esporte como tema, embora as ações se confundam no processo de criação.

O boxe, como o tênis e o futebol ou quaisquer esportes em que duas partes disputam, é a guerra sublimada. Provavelmente, a grande atração que exercem venha daí – consistem em espaços onde a agressividade pode ser colocada de modo controlado, limpo. Mas no boxe, em particular, a relação é mais pungente (ou um pouco menos sublimada), pois há, ali, um corpo a corpo que pode gerar derramamento de sangue, sérias lesões corporais e até mesmo, como já ocorreu, morte; a questão é que há sempre um indivíduo que prevalece e, como espectadores, queremos saber qual será. Sendo um substituto da experiência da guerra, o boxe como objeto da arte é uma espécie de sublimação da sublimação – a civilização em sua economia ordinária de automanutenção potencializada.

Luciana Paes
Professora da Escola de Música e Belas Arte do Paraná/Universidade Estadual do Paraná.
Última atualização
29/8/2023 18:00

Brasil bate recorde na geração de energia eólica em novembro de 2024

Redação Cidade Capital
10/12/2024 10:21

O Brasil atingiu dois recordes consecutivos na geração de energia eólica em novembro deste ano. No dia 3, a produção média horária alcançou 23.699 megawatts médios (MWmed). Já no dia 4, foi registrado o maior volume diário, com 18.976 MWmed. Os dados foram divulgados nesta segunda-feira (9) pelo Ministério de Minas e Energia (MME).

Conforme a pasta, "os resultados destacam o avanço da energia eólica como uma fonte essencial para a matriz energética do país", confirmando o papel dessa tecnologia no fornecimento sustentável de energia.

Filme ‘Ainda estou aqui’ recebe indicação ao Globo de Ouro

Redação Cidade Capital
10/12/2024 10:02

O filme Ainda Estou Aqui, dirigido por Walter Salles, foi indicado ao prêmio Globo de Ouro na categoria de melhor filme de língua estrangeira. A atriz Fernanda Torres também foi indicada a melhor atriz junto com Tilda Swinton, Kate Winslet, Angelina Jolie e Nicole Kidman

Ainda Estou Aqui narra a trajetória da família Paiva — a mãe, Eunice, e os cinco filhos — após o desaparecimento do deputado Rubens Paiva, preso, torturado e morto pela ditadura militar brasileira.