Corrida para a Prefeitura de Curitiba

Opinião

Inocência violada pela insânia de adultos desequilibrados

Abuso sexual em família, denúncias e impacto emocional ganham destaque após relato jornalístico.Abuso sexual em família, denúncias e impacto emocional ganham destaque após relato jornalístico.
Arte Cidade Capital
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Adobe Firefly
Áurea Moneo
Pós-graduada em A Psicanálise do Século XXI, pela Fundação Armando Alvares Penteado (Faap); pós-graduada em Psicanálise, pela Faculdade Álvares de Azevedo (Faatesp); Formação em Psicanálise, pelo Instituto Superior de Psicanálise de Brasília. Outras formações acadêmicas: pós-graduada em Marketing, pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM); pós-graduada em Administração, pela Fundação Getulio Vargas de São Paulo; graduada em Arquitetura, pelo Mackenzie. Responsável pela gestão organizacional e pedagógica do Centro de Formação em Psicanálise Clínica – Illumen, com sede em São Paulo, desde 2010. Leciona Psicanálise, com notória especialidade, responsável pela preparação psicanalítica de novos alunos e professores do Illumen. Atua na clínica psicanalítica desde 2001.
26/4/2024 9:10
Áurea Moneo

<span class="abre-texto">Já faz algum tempo que eu venho ensaiando</span> escrever sobre este tema pesado e recorrente. O gatilho foi um artigo veiculado na BBC Brasil, no último sábado, sobre um jornalista argentino que iniciou o noticiário em Rosário trazendo sua história pessoal da infância, marcada pelo abuso sexual patrocinado por seu pai sobre sua irmã caçula, e o de seu tio sobre ele e o irmão.

A trama não para aí: segundo ele, sua mãe também foi vítima deste companheiro violento e abusivo, de todas as formas possíveis, ao mesmo tempo que cúmplice – ela sabia do que acontecia quando eram pequenos – ele mesmo, aos 12 anos, escancarara a situação, mas ela não tomou nenhuma atitude na época.

Ao final de 2022, após vencer a vergonha e graças a muita terapia, ele denunciou o tio. Em 2023, foi a vez do pai, pela violência doméstica patrocinada por ele. Recentemente conseguiu convencer a irmã a também denunciá-lo por abuso sexual e, há algumas semanas, o abusador em questão acabou se suicidando.

Infelizmente este tema é ainda muito frequente, não importa o país.

Mas o que casos como este trazem em comum?  A maior parte segue encoberta pela própria família que prefere fingir, em verdadeiro movimento negacionista, escolhendo não ver que algo assim possa estar acontecendo debaixo do próprio teto.

As vítimas: crianças que logo se traumatizam ou, a depender da capacidade de sedução do adulto, podem vir a se dar conta do aspecto insidioso do ato só mais tarde. Em ambos os casos, crescem carregadas de marcas, sentindo-se, na maioria das vezes, responsáveis por terem despertado esta lascívia em seus parentais, com receio de verbalizar o que lhes ocorreu, tentando apagar feridas via recalcamento destes traumas e pagando um alto preço por isto.

E de outro lado, não menos vítimas, adultos que provavelmente, em sua maioria, sofreram abusos quando crianças e repetem o padrão por incapacidade elaborativa – algo que não justifica seus atos, porém explica a origem.

Vale aqui um comentário, inspirado no livro de Freud Totem e tabu: o homem primitivo aprendeu a lidar com emoções mais instintivas como esta do incesto quando, ao sair das cavernas e se organizar em grupos maiores, assumiu um novo contrato social, deixando de possuir as mulheres do próprio clã por opção, transformando a partir de então a atração sexual originária por uma relação de ternura por elas. No entanto, alguns ainda, por modelos inadequadas e falhas no interdito, retroagem a esta condição bárbara, fenômeno este conhecido como perversão.  

Estudos mostram que o abuso sexual dentro do ambiente familiar é responsável por quase metade dos casos, patrocinada por alguém do convívio destas crianças, cujo papel seria o de promover suporte emocional.

No Brasil, de acordo com outro artigo da BBC, foram notificados 202.948 casos de violência sexual contra crianças e adolescentes, de 2015 a 2021. Em 2021, o número de notificações foi o maior já registrado no período, com 35.196 casos, segundo o governo federal. E sabemos que há muita subnotificação, por vergonha, omissão ou outros fatores envolvidos.

Os dados brasileiros também apontam que aproximadamente 81% dos agressores são do sexo masculino, no caso de crianças de até 9 anos, e 86%, no caso de adolescentes de 10 a 19 anos, sendo as vítimas predominantemente as meninas – 77% das notificações, na faixa de até 9 anos e quase 93% das notificações, na faixa de 10 a 19 anos.

Já acompanhei muitos relatos em consultório, podendo afirmar que, na imensa maioria, estes pacientes, quando crianças à época do abuso, não tiveram coragem em falar a respeito com algum adulto responsável, seja por medo da retaliação do abusador, seja por vergonha, sentindo-se corresponsáveis. No caso de uns poucos que tentaram fazê-lo, não foram levados a sério tampouco.

A escuta, no setting analítico, tem papel fundamental para auxiliar aquele que viveu este drama a superar os atos insanos patrocinados por alguém profundamente perturbado e perturbador, geralmente um parental próximo o suficiente para dificultar, ainda mais, esta superação.

O objetivo deste tipo de análise é o de estimular a liberação das emoções que foram aprisionadas, promovendo um melhor entendimento do ocorrido para conseguir sair da posição de vítima e, literalmente, virar a página – o que não significa apagar o ocorrido, mas sim não mais permitir um se sentir vulnerável, frágil. A busca é a de se libertar dos envolvidos na trama pelo perdão e auto perdão, promovendo assim o lento, mas consistente afrouxamento das amarras que o aprisionam.

Além do trabalho analítico, caso o adulto abusado na infância queira levar o caso para a esfera jurídica, o apoio à denúncia pode, além de ajudar a reduzir sua angústia, coibir um pouco este reiterado massacre à inocência de outras crianças que igualmente não detêm maturidade emocional a lidar com tal situação, como bem observado no filme Spotlight: segredos revelados, de 2015, acerca da pedofilia no clero.

Certamente esse mesmo apoio, em se tratando de uma criança vivendo a aterradora violência citada, ganha corpo e vira incentivo a que algum outro responsável por ela, agindo com maturidade, venha a separá-la do algoz através dos meios legais para tal. Sobre isso, vale ressaltar o cuidado em avaliar se o discurso da criança é real, se faz parte de uma fantasia infantil ou, ainda, se há outras motivações àquele relato, para se evitar o que aconteceu, tempos atrás, com a Escola Base de São Paulo, vítima de um dos maiores erros jornalísticos sobre o tema, ou mesmo o evento bem relatado no filme sueco A caça, de 2012.

Áurea Moneo
Pós-graduada em A Psicanálise do Século XXI, pela Fundação Armando Alvares Penteado (Faap); pós-graduada em Psicanálise, pela Faculdade Álvares de Azevedo (Faatesp); Formação em Psicanálise, pelo Instituto Superior de Psicanálise de Brasília. Outras formações acadêmicas: pós-graduada em Marketing, pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM); pós-graduada em Administração, pela Fundação Getulio Vargas de São Paulo; graduada em Arquitetura, pelo Mackenzie. Responsável pela gestão organizacional e pedagógica do Centro de Formação em Psicanálise Clínica – Illumen, com sede em São Paulo, desde 2010. Leciona Psicanálise, com notória especialidade, responsável pela preparação psicanalítica de novos alunos e professores do Illumen. Atua na clínica psicanalítica desde 2001.
Última atualização
26/4/2024 9:10

Ciclone extratropical deve atingir parte do Rio Grande do Sul nesta quarta (8)

Ciclone extratropical deve atingir parte do Rio Grande do Sul nesta quarta (8)

Redação Cidade Capital
8/5/2024 21:58

Um ciclone extratropical deve atingir o extremo sul do Rio Grande do Sul nesta quarta-feira (8), com chuvas superiores a 100 milímetros. Pelotas, Rio Grande, Alegrete e São Borja também podem enfrentar tempestades com ventos de até 70 km por hora.

A Defesa Civil recomenda que a população procure abrigos longe de árvores, evite estacionar veículos perto de torres de energia e, se possível, desligar o quadro geral de energia da residência. Em caso de emergência, os números de contato são os bombeiros, pelo 193, ou a Defesa Civil, no 199.

Rio Grande do Sul recebe mais de duzentos purificadores de água

Rio Grande do Sul recebe mais de duzentos purificadores de água

Redação Cidade Capital
8/5/2024 21:15

Mais de duzentos purificadores de água foram entregues ao Rio Grande do Sul, nesta quarta-feira (8). Os equipamentos, adquiridos com fundos arrecadados na internet, chegaram em um voo da Força Aérea Brasileira (FAB) e pousaram em Canoas, região metropolitana de Porto Alegre, e devem ser distribuídos para abrigos públicos mantidos pelas prefeituras.

De acordo com o ministro da Secretaria de Comunicação Social da Presidência (Secom), Paulo Pimenta, os purificadores foram comprados pelo influenciador digital Felipe Neto, com apoio da primeira-dama Janja da Silva.

Opinião

Inocência violada pela insânia de adultos desequilibrados

Abuso sexual em família, denúncias e impacto emocional ganham destaque após relato jornalístico.Abuso sexual em família, denúncias e impacto emocional ganham destaque após relato jornalístico.
Arte Cidade Capital
/
Adobe Firefly
Áurea Moneo
26/4/2024 9:10

<span class="abre-texto">Já faz algum tempo que eu venho ensaiando</span> escrever sobre este tema pesado e recorrente. O gatilho foi um artigo veiculado na BBC Brasil, no último sábado, sobre um jornalista argentino que iniciou o noticiário em Rosário trazendo sua história pessoal da infância, marcada pelo abuso sexual patrocinado por seu pai sobre sua irmã caçula, e o de seu tio sobre ele e o irmão.

A trama não para aí: segundo ele, sua mãe também foi vítima deste companheiro violento e abusivo, de todas as formas possíveis, ao mesmo tempo que cúmplice – ela sabia do que acontecia quando eram pequenos – ele mesmo, aos 12 anos, escancarara a situação, mas ela não tomou nenhuma atitude na época.

Ao final de 2022, após vencer a vergonha e graças a muita terapia, ele denunciou o tio. Em 2023, foi a vez do pai, pela violência doméstica patrocinada por ele. Recentemente conseguiu convencer a irmã a também denunciá-lo por abuso sexual e, há algumas semanas, o abusador em questão acabou se suicidando.

Infelizmente este tema é ainda muito frequente, não importa o país.

Mas o que casos como este trazem em comum?  A maior parte segue encoberta pela própria família que prefere fingir, em verdadeiro movimento negacionista, escolhendo não ver que algo assim possa estar acontecendo debaixo do próprio teto.

As vítimas: crianças que logo se traumatizam ou, a depender da capacidade de sedução do adulto, podem vir a se dar conta do aspecto insidioso do ato só mais tarde. Em ambos os casos, crescem carregadas de marcas, sentindo-se, na maioria das vezes, responsáveis por terem despertado esta lascívia em seus parentais, com receio de verbalizar o que lhes ocorreu, tentando apagar feridas via recalcamento destes traumas e pagando um alto preço por isto.

E de outro lado, não menos vítimas, adultos que provavelmente, em sua maioria, sofreram abusos quando crianças e repetem o padrão por incapacidade elaborativa – algo que não justifica seus atos, porém explica a origem.

Vale aqui um comentário, inspirado no livro de Freud Totem e tabu: o homem primitivo aprendeu a lidar com emoções mais instintivas como esta do incesto quando, ao sair das cavernas e se organizar em grupos maiores, assumiu um novo contrato social, deixando de possuir as mulheres do próprio clã por opção, transformando a partir de então a atração sexual originária por uma relação de ternura por elas. No entanto, alguns ainda, por modelos inadequadas e falhas no interdito, retroagem a esta condição bárbara, fenômeno este conhecido como perversão.  

Estudos mostram que o abuso sexual dentro do ambiente familiar é responsável por quase metade dos casos, patrocinada por alguém do convívio destas crianças, cujo papel seria o de promover suporte emocional.

No Brasil, de acordo com outro artigo da BBC, foram notificados 202.948 casos de violência sexual contra crianças e adolescentes, de 2015 a 2021. Em 2021, o número de notificações foi o maior já registrado no período, com 35.196 casos, segundo o governo federal. E sabemos que há muita subnotificação, por vergonha, omissão ou outros fatores envolvidos.

Os dados brasileiros também apontam que aproximadamente 81% dos agressores são do sexo masculino, no caso de crianças de até 9 anos, e 86%, no caso de adolescentes de 10 a 19 anos, sendo as vítimas predominantemente as meninas – 77% das notificações, na faixa de até 9 anos e quase 93% das notificações, na faixa de 10 a 19 anos.

Já acompanhei muitos relatos em consultório, podendo afirmar que, na imensa maioria, estes pacientes, quando crianças à época do abuso, não tiveram coragem em falar a respeito com algum adulto responsável, seja por medo da retaliação do abusador, seja por vergonha, sentindo-se corresponsáveis. No caso de uns poucos que tentaram fazê-lo, não foram levados a sério tampouco.

A escuta, no setting analítico, tem papel fundamental para auxiliar aquele que viveu este drama a superar os atos insanos patrocinados por alguém profundamente perturbado e perturbador, geralmente um parental próximo o suficiente para dificultar, ainda mais, esta superação.

O objetivo deste tipo de análise é o de estimular a liberação das emoções que foram aprisionadas, promovendo um melhor entendimento do ocorrido para conseguir sair da posição de vítima e, literalmente, virar a página – o que não significa apagar o ocorrido, mas sim não mais permitir um se sentir vulnerável, frágil. A busca é a de se libertar dos envolvidos na trama pelo perdão e auto perdão, promovendo assim o lento, mas consistente afrouxamento das amarras que o aprisionam.

Além do trabalho analítico, caso o adulto abusado na infância queira levar o caso para a esfera jurídica, o apoio à denúncia pode, além de ajudar a reduzir sua angústia, coibir um pouco este reiterado massacre à inocência de outras crianças que igualmente não detêm maturidade emocional a lidar com tal situação, como bem observado no filme Spotlight: segredos revelados, de 2015, acerca da pedofilia no clero.

Certamente esse mesmo apoio, em se tratando de uma criança vivendo a aterradora violência citada, ganha corpo e vira incentivo a que algum outro responsável por ela, agindo com maturidade, venha a separá-la do algoz através dos meios legais para tal. Sobre isso, vale ressaltar o cuidado em avaliar se o discurso da criança é real, se faz parte de uma fantasia infantil ou, ainda, se há outras motivações àquele relato, para se evitar o que aconteceu, tempos atrás, com a Escola Base de São Paulo, vítima de um dos maiores erros jornalísticos sobre o tema, ou mesmo o evento bem relatado no filme sueco A caça, de 2012.

Última atualização
26/4/2024 9:10
Áurea Moneo
Pós-graduada em A Psicanálise do Século XXI, pela Fundação Armando Alvares Penteado (Faap); pós-graduada em Psicanálise, pela Faculdade Álvares de Azevedo (Faatesp); Formação em Psicanálise, pelo Instituto Superior de Psicanálise de Brasília. Outras formações acadêmicas: pós-graduada em Marketing, pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM); pós-graduada em Administração, pela Fundação Getulio Vargas de São Paulo; graduada em Arquitetura, pelo Mackenzie. Responsável pela gestão organizacional e pedagógica do Centro de Formação em Psicanálise Clínica – Illumen, com sede em São Paulo, desde 2010. Leciona Psicanálise, com notória especialidade, responsável pela preparação psicanalítica de novos alunos e professores do Illumen. Atua na clínica psicanalítica desde 2001.

Ciclone extratropical deve atingir parte do Rio Grande do Sul nesta quarta (8)

Ciclone extratropical deve atingir parte do Rio Grande do Sul nesta quarta (8)

Redação Cidade Capital
8/5/2024 21:58

Um ciclone extratropical deve atingir o extremo sul do Rio Grande do Sul nesta quarta-feira (8), com chuvas superiores a 100 milímetros. Pelotas, Rio Grande, Alegrete e São Borja também podem enfrentar tempestades com ventos de até 70 km por hora.

A Defesa Civil recomenda que a população procure abrigos longe de árvores, evite estacionar veículos perto de torres de energia e, se possível, desligar o quadro geral de energia da residência. Em caso de emergência, os números de contato são os bombeiros, pelo 193, ou a Defesa Civil, no 199.

Rio Grande do Sul recebe mais de duzentos purificadores de água

Rio Grande do Sul recebe mais de duzentos purificadores de água

Redação Cidade Capital
8/5/2024 21:15

Mais de duzentos purificadores de água foram entregues ao Rio Grande do Sul, nesta quarta-feira (8). Os equipamentos, adquiridos com fundos arrecadados na internet, chegaram em um voo da Força Aérea Brasileira (FAB) e pousaram em Canoas, região metropolitana de Porto Alegre, e devem ser distribuídos para abrigos públicos mantidos pelas prefeituras.

De acordo com o ministro da Secretaria de Comunicação Social da Presidência (Secom), Paulo Pimenta, os purificadores foram comprados pelo influenciador digital Felipe Neto, com apoio da primeira-dama Janja da Silva.

Cidade Capital é um projeto de jornalismo.

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