Corrida para a Prefeitura de Curitiba

Opinião

Do medo à esperança, a redescoberta de espaços de poder

Relato pessoal de experiência transformadora em Vara de Família do Boqueirão destaca a importância do acolhimento e humanização em espaços públicos.Relato pessoal de experiência transformadora em Vara de Família do Boqueirão destaca a importância do acolhimento e humanização em espaços públicos.
Arte Cidade Capital
/
Adobe Firefly
Jane Hir

<span class="abre-texto">Na semana passada eu compareci</span>, como acompanhante de uma pessoa intimada, a uma audiência na 2ª Vara Descentralizada do Boqueirão – Vara de Família.

Espaços públicos institucionais são notadamente espaços de poder e, para as classes menos favorecidas, transitar nesses espaços é, muitas vezes, penoso. Apesar da minha trajetória acadêmica e do conhecimento dos meus direitos, esses espaços costumam acordar em mim memórias de exclusão e até de medo.

Cheguei com bastante antecedência ao lugar marcado, mas, ainda assim, com o coração aos saltos como se estivesse diante da iminência de uma punição. Racionalmente, não havia nenhum motivo para essa angústia. Incrível como o nosso corpo guarda as marcas emocionais do que foi vivido!

O meu estado emocional não me permitiu perceber o acolhimento natural da atendente que, ao nos receber no portão, pediu nossos documentos para a identificação. Nervosa, demorei a encontrar o documento na bolsa e pedi desculpas três vezes durante os segundos em que procurava. Entregues e conferidos os nossos documentos, fomos convidados a entrar.

Só nesse momento, consegui emergir ao momento presente e percebi que aquele ambiente institucional apresentava um perfil diferente daqueles que a minha memória emocional guardara. Com a respiração mais leve e os batimentos cardíacos normalizados notei a gentileza presente naqueles que faziam seu trabalho de recepção.

Surpresa, pude enxergar um espaço público destinado a acolher pessoas para a resolução de conflitos. Solicitei para entrar com a pessoa que eu estava acompanhando. Não foi permitido, mas isso foi feito de maneira respeitosa. Uma das pessoas até brincou conosco e explicou amavelmente os trâmites e a sequência do que iria acontecer.

Aos poucos, a menina assustada de outrora se sentiu curada, sorriu e se afastou tranquila. A mulher madura, estudiosa da Comunicação Não-Violenta e da Neurociência analisa agora o impacto positivo de uma postura humanizada nos espaços institucionais que são públicos, e portanto, em essência deveriam ser humanos.

Além da linguagem verbal aliada à linguagem corporal, a organização espacial também comunica: pode acolher ou oprimir, reconhecer ou excluir. A disposição das cadeiras, a limpeza dos sanitários, o purificador de água, os vídeos institucionais transmitidos com excelência de som e imagem eram pequenos detalhes que traduziam, naquele lugar, a intenção de acolhimento e respeito dos gestores.

Em tempos tão difíceis em que se reproduzem a indiferença e a exclusão, a experiência vivida no referido espaço me aquece o coração e me traz a esperança de que outras instituições também se humanizem.

Recordo-me então da Ressonância mórfica ou Teoria do centésimo macaco que preconiza uma mudança no comportamento coletivo quando um número expressivo de indivíduos assume outra forma de agir. Sem querer adentrar em uma área que não conheço, tomo esse experimento científico apenas como metáfora da mudança também proposta por Ghandi: Sejamos a mudança que desejamos no mundo.

A cada um de nós cabe o cuidado permanente com nossos pensamentos, palavras e ações na perspectiva de uma efetiva mudança dos nossos padrões relacionais. A começar por nós um outro mundo é possível!

Última atualização
2/3/2024 16:22
Jane Hir
Mestra em Educação (UFPR); Professora de língua portuguesa; Especialista em Educação de Jovens e Adultos; Facilitadora de Práticas Restaurativas — Eseje (2017) e SCJR/Coonozco (2018); Especialista em Práticas Restaurativas, com enfoque em Direitos Humanos (PUCPR); Especialista em Neurociências, Psicologia Positiva e Mindfulness (PUCPR).

Compreender o passado ajuda a construir um presente consciente

Compreender o passado ajuda a construir um presente consciente

Maku de Almeida
19/5/2024 16:26

Uma sequência de decisões me trouxe até aqui. Nem todas foram boas ou sensatas. Algumas foram realmente muito ruins. Gosto muito deste "aqui" e fico tentada a pensar: eu chegaria até aqui por outro caminho? Há coisas que ainda quero iluminar. Não me falta coragem. Mas há grandes e sensacionais conquistas. Portanto, gratidão ao aqui. Pois o lá já virou pó.

A respeito disso, um filósofo espanhol que eu aprecio sem moderação, José Ortega y Gasset, em seu livro Meditaciones del Quijote, diz: “eu sou eu e minha circunstância e se não salvo a ela, não salvo a mim".

Preparar panquecas e viver é uma receita de amor e paciência

Preparar panquecas e viver é uma receita de amor e paciência

Jane Hir
19/5/2024 16:08

Algumas comidas são marcadas pelo afeto. Tenho memória afetiva de muitas e entre elas está a panqueca. Na minha infância, que já transcorreu há muito tempo, a mágica das rodelas de massa dourada sendo viradas em um gesto preciso era realizada pela minha avó.

Em uma época de poucas variedades alimentícias, pelo menos para uma família numerosa como a nossa e mantida por um pai operário, a panqueca recheada de doce de leite feito em casa ou apenas polvilhada com açúcar e canela, assumia ares de requinte.

Opinião

Do medo à esperança, a redescoberta de espaços de poder

Relato pessoal de experiência transformadora em Vara de Família do Boqueirão destaca a importância do acolhimento e humanização em espaços públicos.Relato pessoal de experiência transformadora em Vara de Família do Boqueirão destaca a importância do acolhimento e humanização em espaços públicos.
Arte Cidade Capital
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Jane Hir
Mestra em Educação (UFPR); Professora de língua portuguesa; Especialista em Educação de Jovens e Adultos; Facilitadora de Práticas Restaurativas — Eseje (2017) e SCJR/Coonozco (2018); Especialista em Práticas Restaurativas, com enfoque em Direitos Humanos (PUCPR); Especialista em Neurociências, Psicologia Positiva e Mindfulness (PUCPR).
2/3/2024 16:20
Jane Hir

Do medo à esperança, a redescoberta de espaços de poder

<span class="abre-texto">Na semana passada eu compareci</span>, como acompanhante de uma pessoa intimada, a uma audiência na 2ª Vara Descentralizada do Boqueirão – Vara de Família.

Espaços públicos institucionais são notadamente espaços de poder e, para as classes menos favorecidas, transitar nesses espaços é, muitas vezes, penoso. Apesar da minha trajetória acadêmica e do conhecimento dos meus direitos, esses espaços costumam acordar em mim memórias de exclusão e até de medo.

Cheguei com bastante antecedência ao lugar marcado, mas, ainda assim, com o coração aos saltos como se estivesse diante da iminência de uma punição. Racionalmente, não havia nenhum motivo para essa angústia. Incrível como o nosso corpo guarda as marcas emocionais do que foi vivido!

O meu estado emocional não me permitiu perceber o acolhimento natural da atendente que, ao nos receber no portão, pediu nossos documentos para a identificação. Nervosa, demorei a encontrar o documento na bolsa e pedi desculpas três vezes durante os segundos em que procurava. Entregues e conferidos os nossos documentos, fomos convidados a entrar.

Só nesse momento, consegui emergir ao momento presente e percebi que aquele ambiente institucional apresentava um perfil diferente daqueles que a minha memória emocional guardara. Com a respiração mais leve e os batimentos cardíacos normalizados notei a gentileza presente naqueles que faziam seu trabalho de recepção.

Surpresa, pude enxergar um espaço público destinado a acolher pessoas para a resolução de conflitos. Solicitei para entrar com a pessoa que eu estava acompanhando. Não foi permitido, mas isso foi feito de maneira respeitosa. Uma das pessoas até brincou conosco e explicou amavelmente os trâmites e a sequência do que iria acontecer.

Aos poucos, a menina assustada de outrora se sentiu curada, sorriu e se afastou tranquila. A mulher madura, estudiosa da Comunicação Não-Violenta e da Neurociência analisa agora o impacto positivo de uma postura humanizada nos espaços institucionais que são públicos, e portanto, em essência deveriam ser humanos.

Além da linguagem verbal aliada à linguagem corporal, a organização espacial também comunica: pode acolher ou oprimir, reconhecer ou excluir. A disposição das cadeiras, a limpeza dos sanitários, o purificador de água, os vídeos institucionais transmitidos com excelência de som e imagem eram pequenos detalhes que traduziam, naquele lugar, a intenção de acolhimento e respeito dos gestores.

Em tempos tão difíceis em que se reproduzem a indiferença e a exclusão, a experiência vivida no referido espaço me aquece o coração e me traz a esperança de que outras instituições também se humanizem.

Recordo-me então da Ressonância mórfica ou Teoria do centésimo macaco que preconiza uma mudança no comportamento coletivo quando um número expressivo de indivíduos assume outra forma de agir. Sem querer adentrar em uma área que não conheço, tomo esse experimento científico apenas como metáfora da mudança também proposta por Ghandi: Sejamos a mudança que desejamos no mundo.

A cada um de nós cabe o cuidado permanente com nossos pensamentos, palavras e ações na perspectiva de uma efetiva mudança dos nossos padrões relacionais. A começar por nós um outro mundo é possível!

Jane Hir
Mestra em Educação (UFPR); Professora de língua portuguesa; Especialista em Educação de Jovens e Adultos; Facilitadora de Práticas Restaurativas — Eseje (2017) e SCJR/Coonozco (2018); Especialista em Práticas Restaurativas, com enfoque em Direitos Humanos (PUCPR); Especialista em Neurociências, Psicologia Positiva e Mindfulness (PUCPR).
Última atualização
2/3/2024 16:22

Compreender o passado ajuda a construir um presente consciente

Eu e minhas circunstâncias à busca de propósito

Maku de Almeida
19/5/2024 16:26

Uma sequência de decisões me trouxe até aqui. Nem todas foram boas ou sensatas. Algumas foram realmente muito ruins. Gosto muito deste "aqui" e fico tentada a pensar: eu chegaria até aqui por outro caminho? Há coisas que ainda quero iluminar. Não me falta coragem. Mas há grandes e sensacionais conquistas. Portanto, gratidão ao aqui. Pois o lá já virou pó.

A respeito disso, um filósofo espanhol que eu aprecio sem moderação, José Ortega y Gasset, em seu livro Meditaciones del Quijote, diz: “eu sou eu e minha circunstância e se não salvo a ela, não salvo a mim".

Preparar panquecas e viver é uma receita de amor e paciência

Jane Hir
19/5/2024 16:08

Algumas comidas são marcadas pelo afeto. Tenho memória afetiva de muitas e entre elas está a panqueca. Na minha infância, que já transcorreu há muito tempo, a mágica das rodelas de massa dourada sendo viradas em um gesto preciso era realizada pela minha avó.

Em uma época de poucas variedades alimentícias, pelo menos para uma família numerosa como a nossa e mantida por um pai operário, a panqueca recheada de doce de leite feito em casa ou apenas polvilhada com açúcar e canela, assumia ares de requinte.

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