<span class="abre-texto">Trago como pauta um episódio juvenil</span> que, hoje, pode ser visto até como banal. Isso ocorre porque muitos outros, bem mais impactantes, passaram a fazer parte do nosso cotidiano. Ainda assim, especialmente quando nos afeta de perto, traz uma inquietação do tipo: “para onde estamos caminhando?”. O fato é um recorte de uma cena inusitada em sala de aula, numa renomada faculdade paulista. Duas garotas discutem, uma dá um soco na outra, e a professora chama a polícia.
Discussões fazem parte da vida, sabemos disso. Jovens tendem a ser mais aguerridos em suas posições, mas o desfecho suscita reflexões importantes.
Primeiro, o que leva um adolescente a perder sua capacidade de dialogar com o outro? A renunciar à interlocução saudável, que, mesmo divergente e acalorada, é uma importante característica dessa fase da vida? Resta a esse jovem, como alternativa, uma atitude tão regressiva e irrefletida, conhecida como acting out, um agir impensado e incontrolado, para fora.
Depois, como as instituições lidam com questões como essas, já que precisam recorrer a uma autoridade formal constituída, no caso, literalmente o poder da polícia, por não se autorizarem a assumir o controle da situação?
Não seria esperado que adultos, suficientemente preparados, buscassem acalmar as partes, chamando-as à razão, como forma de resgatar a lucidez, por meio da interdição da atitude inadequada?
É assim que aprendemos a educar crianças que se engalfinham: separando-as e conversando com elas. Aquelas jovens universitárias, naquele episódio, comportaram-se, sem dúvida, como crianças.
Se, enquanto protagonistas, perdemos facilmente o controle, então nos acovardamos, sem coragem de agir, no sentido de resgatar o interdito, o limite. O bom senso para lidar com o desagradável que vem de fora está intimamente relacionado com a incapacidade interna de suportar as próprias angústias. Observamos também o declínio de nosso papel de mediadores, agora reduzidos a meros espectadores.
É importante refletirmos sobre o quanto estamos impactados pela escalada da violência. O que nos leva a nos tornarmos reféns da hostilidade que aflora nos ambientes, bloqueando nossa capacidade de avaliar riscos reais e, por vezes, de incentivar o resgate do diálogo? Quando possível, a conversa é algo imprescindível para a vida em sociedade.
Será que essa é uma boa posição para nos colocarmos? Fica aqui uma provocação.
Uma sequência de decisões me trouxe até aqui. Nem todas foram boas ou sensatas. Algumas foram realmente muito ruins. Gosto muito deste "aqui" e fico tentada a pensar: eu chegaria até aqui por outro caminho? Há coisas que ainda quero iluminar. Não me falta coragem. Mas há grandes e sensacionais conquistas. Portanto, gratidão ao aqui. Pois o lá já virou pó.
A respeito disso, um filósofo espanhol que eu aprecio sem moderação, José Ortega y Gasset, em seu livro Meditaciones del Quijote, diz: “eu sou eu e minha circunstância e se não salvo a ela, não salvo a mim".
Algumas comidas são marcadas pelo afeto. Tenho memória afetiva de muitas e entre elas está a panqueca. Na minha infância, que já transcorreu há muito tempo, a mágica das rodelas de massa dourada sendo viradas em um gesto preciso era realizada pela minha avó.
Em uma época de poucas variedades alimentícias, pelo menos para uma família numerosa como a nossa e mantida por um pai operário, a panqueca recheada de doce de leite feito em casa ou apenas polvilhada com açúcar e canela, assumia ares de requinte.
<span class="abre-texto">Trago como pauta um episódio juvenil</span> que, hoje, pode ser visto até como banal. Isso ocorre porque muitos outros, bem mais impactantes, passaram a fazer parte do nosso cotidiano. Ainda assim, especialmente quando nos afeta de perto, traz uma inquietação do tipo: “para onde estamos caminhando?”. O fato é um recorte de uma cena inusitada em sala de aula, numa renomada faculdade paulista. Duas garotas discutem, uma dá um soco na outra, e a professora chama a polícia.
Discussões fazem parte da vida, sabemos disso. Jovens tendem a ser mais aguerridos em suas posições, mas o desfecho suscita reflexões importantes.
Primeiro, o que leva um adolescente a perder sua capacidade de dialogar com o outro? A renunciar à interlocução saudável, que, mesmo divergente e acalorada, é uma importante característica dessa fase da vida? Resta a esse jovem, como alternativa, uma atitude tão regressiva e irrefletida, conhecida como acting out, um agir impensado e incontrolado, para fora.
Depois, como as instituições lidam com questões como essas, já que precisam recorrer a uma autoridade formal constituída, no caso, literalmente o poder da polícia, por não se autorizarem a assumir o controle da situação?
Não seria esperado que adultos, suficientemente preparados, buscassem acalmar as partes, chamando-as à razão, como forma de resgatar a lucidez, por meio da interdição da atitude inadequada?
É assim que aprendemos a educar crianças que se engalfinham: separando-as e conversando com elas. Aquelas jovens universitárias, naquele episódio, comportaram-se, sem dúvida, como crianças.
Se, enquanto protagonistas, perdemos facilmente o controle, então nos acovardamos, sem coragem de agir, no sentido de resgatar o interdito, o limite. O bom senso para lidar com o desagradável que vem de fora está intimamente relacionado com a incapacidade interna de suportar as próprias angústias. Observamos também o declínio de nosso papel de mediadores, agora reduzidos a meros espectadores.
É importante refletirmos sobre o quanto estamos impactados pela escalada da violência. O que nos leva a nos tornarmos reféns da hostilidade que aflora nos ambientes, bloqueando nossa capacidade de avaliar riscos reais e, por vezes, de incentivar o resgate do diálogo? Quando possível, a conversa é algo imprescindível para a vida em sociedade.
Será que essa é uma boa posição para nos colocarmos? Fica aqui uma provocação.
Uma sequência de decisões me trouxe até aqui. Nem todas foram boas ou sensatas. Algumas foram realmente muito ruins. Gosto muito deste "aqui" e fico tentada a pensar: eu chegaria até aqui por outro caminho? Há coisas que ainda quero iluminar. Não me falta coragem. Mas há grandes e sensacionais conquistas. Portanto, gratidão ao aqui. Pois o lá já virou pó.
A respeito disso, um filósofo espanhol que eu aprecio sem moderação, José Ortega y Gasset, em seu livro Meditaciones del Quijote, diz: “eu sou eu e minha circunstância e se não salvo a ela, não salvo a mim".
Algumas comidas são marcadas pelo afeto. Tenho memória afetiva de muitas e entre elas está a panqueca. Na minha infância, que já transcorreu há muito tempo, a mágica das rodelas de massa dourada sendo viradas em um gesto preciso era realizada pela minha avó.
Em uma época de poucas variedades alimentícias, pelo menos para uma família numerosa como a nossa e mantida por um pai operário, a panqueca recheada de doce de leite feito em casa ou apenas polvilhada com açúcar e canela, assumia ares de requinte.